Reviravolta dos dragões em Alvalade- a abordagem tática de Sérgio Conceição e o rescaldo do clássico
- Pensar o Jogo
- 3 de mar. de 2022
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Mais um clássico que fica marcado pelos encaixes das duas equipas a nível tático, principalmente na primeira parte, em detrimento de uma das equipas querer impor o seu estilo de jogar e forma de jogar. Apesar de o FC Porto não fazer um bom jogo, conseguiu, através da estratégia de Sérgio Conceição, anular as muitas virtudes da equipa leonina.
Os dragões em organização defensiva estruturaram-se em 1-5-2-3. Uribe juntou-se aos centrais Pepe e Mbemba fazendo uma linha de 5, com Bruno Costa a LD e Zaidu a LE. O meio-campo apresentou-se com Grujic e Vitinha. A frente de ataque com Fábio Vieira descaído no lado direito, Taremi no lado esquerdo e Evanilson como referência.

Em organização ofensiva colocou-se em 1-4-3-3. Linha de quatro composta por Bruno Costa, Mbemba, Pepe e Zaidu. Uribe no vértice mais recuado, com Grujic e Vitinha como interiores. Fábio Vieira no lado direito, Taremi no lado esquerdo, e Evanilson como referência.

O FC Porto pressionou a 1ª fase de construção do Sporting com os seus três homens mais adiantados a condicionarem os 3 centrais, um encaixe de Vitinha e Grujic em Ugarte e Matheus Nunes, e com os seus dois laterais a saltarem na pressão aos alas leoninos quando estes recebiam a bola. Um bloco que, apesar de ser médio-alto, não foi tão pressionante como em outros jogos.

Uribe tapou Paulinho do jogo, fazendo praticamente uma marcação HxH ao português, e isso refletiu-se muito na qualidade de jogo apresentada pelo Sporting. Isto permitiu ao FC Porto controlar melhor a largura, isto porque o Sporting é uma equipa que projeta muito os seus alas, dando muita largura ao seu jogo. O próprio Sérgio Conceição referiu isso em conferência de imprensa, referindo que era importante, com a entrada de Uribe, controlar melhor a largura, fazendo com que os seus laterais consigam sair na pressão aos alas do Sporting.
No entanto, existiram duas partes distintas. A primeira parte foi marcada pelo encaixe das duas equipas, existindo pouco espaço para jogar, muitos passes falhados, pouca qualidade na construção, que levou o jogo para uma vertente mais física.
Ainda assim, o Sporting através das progressões com bola de Porro conseguiu criar alguns desequilíbrios. Quando o ala espanhol conseguia libertar-se da marcação, causava muita indefinição nos jogadores do FC Porto, pela dúvida existente de quem saltava na pressão ao portador da bola. Matheus Nunes, através da sua capacidade de transporte de bola, também aproveitou algum espaço nessas zonas, todavia, não raras as vezes, decidiu mal. Na retina fica um lance em que o médio português estava perante uma situação de 4x3 no último terço e teve uma decisão bastante deficitária, custando o que poderia ter sido uma oportunidade flagrante de golo para os leões. Foi de longe um dos piores jogos (senão o pior) de Matheus Nunes esta época ao serviço do Sporting.
Estas marcações individuais até beneficiaram mais o Sporting, porque, para além de em certos momentos se ter conseguido libertar dessas marcações (como referi acima), o FC Porto tinha dificuldades no controlo da profundidade. Em muitas ocasiões sofreu nesse contexto do jogo, principalmente pelo lado direito com Nuno Santos - Bruno Costa apresenta debilidades nesse controlo da profundidade, o que é algo natural tendo em conta que não é a sua posição de origem, nem algo que se pareça.
Um início de segunda parte muito idêntico à primeira, com um jogo muito encaixado até ao lance que dá o primeiro golo do jogo - um livre improvisado de Porro que assiste Pablo Sarabia para este fazer um remate em arco de fora da área.
Numa fase em que o FC Porto estava a ter algum ascendente, mas nada de avassalador, Sérgio Conceição já preparava três alterações na equipa, chamando ao banco de suplentes João Mário, Otávio e Pepê, que iriam ser muito importantes no desenrolar da partida. No entanto, Porro tem um erro infantil que dá de bandeja uma oportunidade flagrante para o FC Porto fazer o empate, que Taremi não desperdiçou.
Independentemente do golo, o treinador dos dragões não mudou de ideias, porque sentia que a equipa (palavras do mesmo) “precisava de maior velocidade de trás para a frente com João Mário, ter mais bola com Otávio, e procurar melhor a profundidade com Pepê”. De facto, estas alterações de Sérgio Conceição mudaram muito do que foi o rumo da partida até ao final. Entraram João Mário, Otávio e Pepê, para as saídas de Bruno Costa, Grujic e Fábio Vieira, respetivamente.
O FC Porto passou a controlar o jogo com e sem bola, pressionando de forma mais alta e eficaz o Sporting, sendo que o 2-1 é prova disso mesmo - Otávio abre na direita em João Mário, este faz um passe na profundidade para Pepê (que fez uma rotura entre os dois centrais, Coates e Gonçalo Inácio), o brasileiro faz um bom trabalho à saída precipitada dos postes de Adán, tocando para Taremi, que assiste de forma brilhante Evanilson para o golo dos dragões - uma jogada brilhante, que na sua maioria foi criada por jogadores vindos do banco de suplentes.
A entrada de Otávio veio provar ainda mais que o português é um dos imprescindíveis para Sérgio Conceição, e que a equipa sem a sua presença ressente-se. A sua qualidade com bola, ocupação de espaços e agressividade na reação à perda, fazem dele um jogador com características únicas no plantel.
Outra entrada importante na partida foi a de Pepê que, não sendo tão desequilibrador como Luis Díaz, é um jogador capaz de cumprir com as tarefas propostas por Sérgio Conceição. Um jogador mais forte no corredor central, comparativamente a Luis Díaz, forte no ataque à profundidade e com uma boa qualidade técnica. No que toca ao momento defensivo, algo que Sérgio Conceição valoriza muito no seu jogo, Pepê, apesar de denotar melhorias significativas, está ainda muito longe do nível apresentado por Luis Díaz, e provavelmente daí o surgimento do seu nome em alguns jogos no banco de suplentes.
Uma nota a destacar neste clássico é a mudança de sistema por parte de Rúben Amorim para um 1-4-4-2, nos últimos vinte minutos da partida. Com a entrada de Slimani e a saída de Luís Neto ao minuto 71, o Sporting passou a jogar com dois avançados - Paulinho e Slimani - uma linha de quatro no meio-campo - Ugarte e Matheus Nunes mais centralizados, Edwards pela direita e Sarabia pela esquerda - uma linha defensiva de quatro - Porro, Gonçalo Inácio, Coates e Matheus Reis - e o GR Adán. O treinador leonino já ia deixando algumas pistas tanto nas conferências de imprensa, como na forma como em certos momentos a equipa pressionava os adversários (em 1-4-4-2). A chegada de Slimani também poderá ter sido importante para alimentar ainda mais essa ideia, nomeadamente em jogos que o Sporting esteja à procura do resultado- caso deste clássico. Todavia, não deixa de ser inédito no reinado de Rúben Amorim no Sporting a equipa desfazer-se da linha de 5, mesmo que seja apenas na parte final de um jogo. Até porque, como sabemos, na época passada, quando o Sporting estava à procura do resultado, o treinador mudava peças no xadrez, mas nunca alterava o sistema, colocando jogadores de características diferentes a fazer a mesma posição (casos de Tabata que jogou a ala direito inúmeras vezes, e de Matheus Nunes que também desempenhou essa posição).
Esta poderá ser uma alternativa mais explorada pelo treinador leonino nos próximos tempos? Temos de esperar para ver. A verdade é que, desde a entrada de Slimani e a consequente mudança de sistema, o Sporting intensificou muito os cruzamentos, sendo muitos deles sem qualquer nexo, o que pode ser algo preocupante para pensar em utilizar mais vezes este sistema. Poderá ter sido por consequência da forma como o jogo estava a decorrer e por estar perto do fim? Talvez. Ainda há que aprimorar muita coisa para a utilização desta alternativa mais vezes.
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