Como podemos aperfeiçoar algo que, por si só, aparenta ser já quase perfeito? E que nos aproxima de forma constante e consistente do sucesso, umas vezes em forma de quase consagração, outras vezes em forma de consagração total? Talvez seja essa a maior questão que o sucesso encerra em si mesmo: como melhorar algo que tem dado frutos, que tem merecido destaque e que nos aproxima ou nos leva ao sucesso?
Por norma, quem se depara com esta questão pode encará-la de duas formas. A primeira parte da premissa que nos diz que mexer em algo próximo da perfeição pode ser ruinoso. Em futebol essa “ruína” pode assentar na alteração de princípios e comportamentos que estiveram na base do sucesso entretanto alcançado. Ou na adopção de princípios e comportamentos ambíguos ou anti-natura em relação aos primeiros passos dados em conjunto rumo ao sucesso. A segunda parte da premissa que nos leva a acreditar que é sempre possível melhorar, que há sempre margem para evoluir e que a perfeição total pode e deve ser uma busca constante.
Não podendo dizer com plena certeza que uma abordagem é melhor do que a outra, posso sempre afirmar qual aquela que mais me fascina, desperta interesse e suscita admiração. Por uma questão de identificação ideológica e por uma questão de desafio.
Nesse caso, obviamente a segunda! Por crer que a perfeição é o Santo Graal de todo e qualquer treinador, de todo e qualquer líder inspiracional e transformacional. E por olhar para o actual Liverpool e acreditar ser essa a metamorfose em andamento levada a cabo por Jurgen Klopp.
Se até 2020/2021 o Liverpool era mundialmente conhecido e reconhecido pelo seu futebol “rock ‘n roll” pleno de verticalidade, velocidade vertiginosa, pressing e gegenpressing, esta época estamos a assistir a um refinar da máquina futebolística de Anfield Road.
Para isso têm sido fundamentais quatro factores, os quais são os principais responsáveis pelo aperfeiçoamento e elevação da qualidade de jogo dos reds...
- Klopp: o timoneiro alemão revelou inteligência extrema ao perceber que a sua equipa necessitava de controlar e dominar melhor o jogo com bola, mas em diferentes ritmos e tempos. A essa percepção seguiu-se a tomada de decisão que o levou a procurar a peça-chave para que o Liverpool pudesse ser mais assertivo e dominante em ataque posicional. Encontrada a peça-chave, faltava apenas fazê-la aterrar em Anfield e começar a trabalhar...
- Thiago Alcântara: A peça-chave. A inteligência, o recorte técnico, a classe e a capacidade de agarrar o tempo e manuseá-lo com a cabeça e os pés tornam o hispano-brasileiro o fiel depositário de todos os melhores sonhos existentes na cabeça e no coração de Klopp. Mais do que um jogador diferenciado, é o jogador que mais impacto teve no modelo de jogo que elevou o Liverpool ao patamar de uma das três melhores equipa do mundo nos últimos quatro anos. A ponto de dotar o momento de organização ofensiva dos reds de mais imprevisibilidade e mais variabilidade, aumentando-lhe de forma exponencial o controlo e o domínio do jogo nos últimos 40 metros...
- Fabinho: o equilibrador da equipa, o jogador que permite e suporta as investidas atacantes de Robertson e Arnold e que protege o espaço à frente de Van Dijk. O internacional brasileiro é um elemento preponderante na manobra da equipa, impedindo que os adversários procurem o ataque à profundidade nas costas do gigante holandês, graças a uma leitura de jogo perfeita que lhe permite antecipar cenários e reagir à perda de bola de forma rápida e eficaz...
- T.A.Arnold: há quem diga que é um “10” adaptado a lateral. Para mim é um dos melhores intérpretes futebolísticos do mundo na actualidade. Pelo que dá à equipa em termos ofensivos, não apenas sobre o corredor lateral, mas essencialmente quando pisa terrenos mais interiores. A forma como se associa e combina em triangulações na meia direita ou já em pleno corredor central, a forma como surge mais por dentro e cruza ao segundo poste a solicitar a entrada de Robertson e a forma como também surge por dentro para efectuar passes de ruptura que colocam os companheiros na “cara do golo” ajudam a explicar grande parte desta nova faceta atacante do Liverpool.
O que nos leva ao título deste artigo. Por mais que as pessoas insistam em querer ver Guardiola e Klopp, o citizens e reds como extremos opostos em termos de futebol jogado, eu vejo um Liverpool cada vez mais próximo do Manchester City. A génese não é a mesma, mas o reforço e o aperfeiçoamento da identidade e do actual modelo de jogo de Klopp assentam precisamente na ideia matriz que faz do City uma equipa única e inigualável no que ao ataque posicional diz respeito.
E esse aperfeiçoamento não é só visível, como também é bem-vindo. Por elevar o Liverpool à condição de equipa mais completa e com maior variabilidade ofensiva da actualidade. E por nos mostrar que, afinal, é possível procurar a perfeição quando se é bem sucedido...sem que isso prejudique o próprio sucesso.
Lances em Ataque Posicional Liverpool vs Vilarreal
Redigido por Laurindo Filho
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