GD Estoril Praia, uma equipa composta por 27 atletas, 14 deles estrangeiros, com uma média de idade de 25 anos e avaliada em 23 milhões.
O homem do leme, Bruno Pinheiro, técnico de 45 anos, depois de alguns anos no Qatar, com a experiência na Aspire, teve a sua estreia na II Liga, assumiu a equipa na época 2020/2021, chegou às meias finais da Taça de Portugal, e foi campeão da II Liga, com o segundo melhor ataque e a segunda melhor defesa. Para além destas evidências, o Estoril destacou-se também pela sua forma de jogar!
O regresso ao principal escalão do Futebol Português chegou com o Estoril a praticar um futebol ofensivo e agradável, deixando no ar a ideia de que iriam ser uma bela surpresa para esta temporada, principalmente no que tocava a ideias de jogo. Os reforços foram escolhidos a dedo, em função do mercado, tanto nacional como internacional, dando o exemplo de Arthur Gomes, Geraldes ou Baró, olhando também para a formação interna e, promovendo jovens de potencial, como André Franco, ou alguns elementos que disputaram e se sagraram campeões da Liga Revelação, como Bernardo Vital ou Chiquinho.
Actualmente, o Estoril assume o 6º lugar, muito próximo dos lugares que dão acesso a posições europeias, quando estamos com 17 jornadas decorridas. Tem feito do seu reduto, o Estádio António Coimbra da Mota, uma verdadeira fortaleza, onde só sucumbiu perante o Sporting e, nesta ultima jornada frente ao FC Porto, depois de estar a vencer por 2-0.
Revelam uma identidade muito própria, um plantel muito equilibrado, com pelo menos 2 jogadores por posição, o que aumenta a competitividade interna e melhora a qualidade do treino. O 4-3-3 tem sido o sistema que o Estoril mais tem utilizado até ao momento.
Estes são os jogadores em que o Mister Bruno Pinheiro mais tem utilizado, para cumprir as suas instruções táticas em campo, mas cada jogador tem um perfil diferente o que permite à equipa ser bastante multidimensional, nomeadamente na posse de bola.
Momento Ofensivo
É uma equipa que privilegia a construção com um futebol apoiado desde trás e com os centrais e guarda-redes a terem grande importância. Constroem com os centrais, com o apoio do médio defensivo posicionado atrás da primeira linha de pressão adversária e com os laterais ligeiramente projetados, mas a oferecerem também linha de passe. Este formato em construção acaba por atrair o adversário e abrir espaço mais à frente. Os centrais e GR possuem conforto em posse e qualidade no passe. Entendem os timings para acelerar e ações que devem ter em cada momento. São várias as vezes que os centrais com passes tensos colocam a bola diretamente nos interiores ou no PL.
Os dois interiores possuem muita liberdade em termos táticos - posicionam-se maioritariamente em espaços entre linhas, juntam-se várias vezes ao extremo do seu lado, à referência atacante ou procuram movimentos de ataque à profundidade. Os laterais têm elevada propensão ofensiva, jogando maioritariamente junto ao corredor, mas movimentando-se várias vezes por dentro e criando mais espaço para o extremo encarar no 1x1 (Soria, por exemplo, é o mais capacitado para jogar em espaços interiores). Já os extremos ficam abertos, oferecendo profundidade e largura à equipa.
Na primeira fase de construção, os centrais abrem e o guarda-redes joga quase como um líbero, tendo conforto em jogar curto ou longo.
Com a utilização do guarda-redes, a equipa consegue criar uma superioridade numérica que lhe permite atrair o adversário e ter maior conforto na construção de jogo.
O trinco, ocupa o espaço atrás da primeira linha de pressão do adversário, dando sempre linha de passe. Os laterais dão largura ao jogo, não se projectam muito nesta fase, têm que ser vistos e dar uma solução no pé ao colega. Os extremos permanecem altos e junto ao corredor, enquanto os interiores ficam entre linhas e com liberdade tática. O PL fica nesta fase junto aos centrais do adversário, forçando a linha defensiva a recuar por meio de alguns movimentos de ataque à profundidade em momentos de bola descoberta. Desta forma, o Estoril consegue ter o chamado "campo largo", que lhe permite ter espaços importantes para posteriormente continuar a desenvolver o seu jogo ofensivo.
Para a posição de trinco, Bruno Pinheiro privilegia um jogador que se destaque pelas competências defensivas e que tenha capacidades no momento de construção. Invariavelmente a bola passa várias vezes pelo trinco (quase sempre Gamboa), mas este jogador, pelas suas características, não assume deliberadamente o jogo, tentando jogar simples e a poucos toques. O papel de criatividade e desequilibrio é entregue aos homens à sua frente.
Quando a progressão com um futebol associado desde trás não é possível, o Estoril joga directo, mas com critério. Os centrais e laterais são jogadores com boa qualidade de passe a longas distâncias, pelo que, por vezes, apostam em passes longos a procurar a profundidade ou a largura oferecida pelos avançados e os movimentos de rutura dos interiores.
Para progredir no terreno de jogo, o Estoril aposta frequentemente no passe vertical para zonas de criação quer para médios interiores ou para ponta de lança. A partir daí conjuga-se a qualidade técnica e criatividade dos interiores com o apoio dos extremos e ponta de lança, desenvolvendo-se dinâmicas muitas vezes letais. Em zonas de criação, os jogadores têm uma liberdade posicional que lhes permite ocupar várias funções de acordo com a bola e posicionamento dos colegas.
O Estoril tem atualmente uma média de 52,6 passes progressivos por 90 na Primeira Liga, bem como 36,23 passes longos com uma precisão de 57,3 por cento no último, que é um dos mais altos na divisão principal de Portugal.
A principal fonte de criação de situações de golo no Estoril são os corredores laterais.
Estes dados são do jogo com o Gil Vicente, que posteriormente terminou em 2-2 no Estádio António Coimbra da Mota. Dos 28 ataques posicionais do Estoril , 23 vieram dos flancos e apenas seis vindos dos corredores centrais.
A equipa cria uma sobrecarga num corredor, atraindo o bloco defensivo do adversário, para depois variar rapidamente o centro de jogo e aproveitar o lado contrário e obtendo situações de superioridade numérica. Quando não variam o centro de jogo, conseguem, mesmo assim, criar situações de perigo pelas microestruturas desenvolvidas constantemente pela permuta constante de posições entre lateral, interior e extremo. As constantes movimentações e posicionamentos de atração e indefinição acabam por manipular o adversário e permitir à equipa atacar espaços que os aproximam do golo.
Em termos de cruzamentos, o Estoril pode ser eficiente com uma precisão de 35,2 por cento até agora nesta temporada, o que significa que um em cada três cruzamentos são bem-sucedidos para eles. Têm o sexto maior número de cruzamentos na Primeira Liga, com média de 19 cruzamentos por 90. No entanto, o problema de depender do cruzamento para o Estoril é que esta forma de criação do acaso tem uma taxa de conversão notoriamente baixa. O Estoril marcou 16 golos no campeonato, mas tem vindo a superar o seu xG que é de 11,88 .
“Eu não concebo uma posse de bola, no sentido de ter a posse de bola. Para mim só faz sentido trabalhar a bola para quebrar linhas, para progredir no campo enquanto equipa” - Bruno Pinheiro, Estoril TV (2020)
O Estoril coloca vários homens a ameaçar constantemente a linha defensiva adversária. Os interiores têm grande capacidade de definição e eficiência no gesto técnico, principalmente André Franco, pelo que, quando conseguem ficar de frente para a linha defensiva adversária, conseguem aproveitar bem o espaço e as movimentações dos colegas. Já os extremos são naturais desequilibradores, que possuem também uma boa definição, agastando, juntamente com laterais, por completo os adversários que têm pela frente.
Chegando a zonas de finalização colocam vários homens dentro ou perto da área. Os dois interiores são homens com liberdade para chegarem a zonas de finalização, aparecendo ambos, juntamente com o extremo do lado contrário, o ponta de lança e, por vezes, o lateral do lado oposto para finalizar.
Em transição ofensiva a equipa beneficia de ter homens na frente e a meio-campo de grande qualidade que acabam por definir e desequilibrar com facilidade, ainda para mais quando há espaço para tal. André Franco, Chiquinho e Arthur são as principais referências para ativar contra-ataques.
Uma construção de primeira que vem desde a temporada passada e que se caracteriza pelo constante uso do guarda-redes para criar superioridades desde trás, pela presença dos laterais em zonas muito baixas que condiciona a pressão adversária, pela (muita) paciência para mover a primeira linha de pressão adversária e ainda, pela capacidade das individualidades para entenderem o timing e a ação que lhes permite acelerar e chegar com maior eficácia a zonas adiantadas. A forma como o Estoril manipula a pressão é soberba e poucas serão as equipas com a qualidade do Estoril a construir desde trás e a chegar com tanta qualidade ao último terço.
Momento Defensivo
Defensivamente, o Estoril é marcado por processos solidificados, estabilidade e por uma grande entreajuda por parte de todos. Mostra em cada partida ser uma equipa equilibrada, compacta e com uma boa perceção do que fazer consoante a situação e o momento de jogo.
O maior destaque em fase defensiva vai para a reação pós perda de toda a equipa. Os canarinhos são altamente agressivos e intensos na reação à perda, formam rapidamente zonas de pressão em redor da bola e conseguem recuperar a posse ou obrigar o adversário a recuar. Quando esta primeira fase de pressão é ultrapassada têm grande compromisso defensivo, conseguindo rapidamente reagrupar.
Em organização defensiva assumem regularmente um bloco médio-alto, estruturando-se num 1x5x4x1 altamente mutável ou em 1x4x4x3 e apresentando dinâmicas de pressão com referências individuais.
Nesta fase de pressão média-alta, a intenção do Estoril passa por condicionar os jogadores adversários, fechar linhas de passe e forçar ao erro. O Estoril é uma equipa que defende com linhas próximas e compactas, e que tenta dirigir o adversário para zonas com menores linhas de passe, para que depois consiga depois congestionar essas zonas.
A equipa entende na perfeição os momentos de pressionar alto e de recuar e estão completamente sincronizados neste tipo de comportamentos.
Em 4x4x3, os extremos pressionam os centrais adversários, o PL fica mais recuado, normalmente perto da zona de ação do trinco, os laterais sobem para pressionarem os laterais adversários, os médios marcam a referência individual a meio-campo.
Quando é obrigado a descer para um bloco médio-baixo, ou quando a primeira fase de pressão não resultou, o Estoril apresenta um 1x5x4x1, com os extremos a recuarem, posicionando-se mais por dentro, e o trinco a baixar para o meio da dupla de centrais, actuando como terceiro central.
A passagem para os cinco defesas permite ao Estoril ter muito mais segurança na defesa do espaço entre o meio-campo e a defesa. A linha defensiva tem comportamentos hxh consoante referências individuais. Os centrais e trinco perseguem os jogadores adversários posicionados entre linhas, quando estes têm a bola, não os deixando orientar-se de frente para o jogo e obrigando-o a recuar. Um dos pontos negativos desta perseguição constante aos homens à frente da linha defensiva reside no facto de determinadas zonas deixarem de ser ocupadas e que por isso o adversário, quando bem preparado, consegue aproveitar.
A linha média tem um influente papel nos momentos de pressão - esta linha é, habitualmente, formada por extremos e interiores, que se mantêm próximos em termos de largura, e está em constante mudança conforme as referências individuais que os jogadores têm. Não são raras as vezes em que um dos interiores ou extremo salta na pressão e junta-se ao PL, por exemplo. No momento em que a bola vai para um corredor, o Estoril forma uma estrutura que pressiona o portador da bola e marca os jogadores próximos, deixando o adversário sem linhas de passe. Nestes casos, o extremo do lado contrário passa a ocupar um espaço mais central com o intuito de impedir a variação do centro do jogo.
A linha defensiva tem comportamentos de qualidade elevada ao nível da coordenação, orientação corporal, posicionamentos, movimentação à largura e à profundidade. O Estoril, sendo uma equipa que coloca várias unidades no ataque, sofre algumas transições em que o adversário tem espaço para atacar a última linha, mas a qualidade defensiva, principalmente de centrais e trinco, consegue resolver este tipo de problemas.
A equipa de Bruno Pinheiro tem um dos melhores registos defensivos do campeonato até ao momento - é das seis equipas com menos golos sofridos. Vejam no vídeo alguns dos princípios defensivos da equipa.
O GD Estoril Praia é uma equipa com uma identidade muito própria e a fugir do protótipo normal do nosso campeonato. O modelo de jogo valoriza imenso os seus jogadores com e sem bola, responsabiliza o jogador a cada tomada de decisão e fá-los evoluir enormidades ao nível do conhecimento e leitura do jogo. É incrível a qualidade do plantel e o trabalho de Scouting que ano após ano o clube tem feito. Impossível não dar todo o mérito ao treinador, não só pelos resultados que tem obtido, como pela forma como conseguiu formar um coletivo tão forte, em que todos os jogadores estão entrosados, sintonizados e identificados com as ideias do técnico.
Destaques Individuais
Quando uma equipa sobe de divisão, é normal que se pense que os jogadores podem sentir o impacto de uma exigência maior.
O médio-ofensivo André Franco, 23 anos, e o extremo Chiquinho, 21 anos, têm estado em destaque esta temporada no Estoril, quinto classificado da Liga Bwin, situação que tem suscitado o interesse de alguns emblemas estrangeiros.
Na época passada, Franco, variava entre a titularidade e o banco; nesta, é indiscutível e um dos maiores talentos da prova. Jogou em todos os 17 jogos feitos até ao momento, marcou 7 golos, fez 4 assistências e transbordou qualidade técnica. Um pé esquerdo mágico, o homem das bolas paradas dos canarinhos. André Franco é um médio interior moderno que alia capacidade tática a vantagens técnicas e físicas, com muita presença e preponderância no último terço. Não só tem golo, como também apresenta capacidade para assistir quem o faça. Apesar de ter o 10 nas costas, não se coíbe das tarefas defensivas destacando-se pela sua disponibilidade e responsabilidade em pressionar na reação à perda da posse de bola.
Chiquinho cumpriu a sua formação com passagens por Sporting CP, CD Tondela e GD Estoril Praia. É um extremo velocíssimo e altamente desequilibrador que pode jogar em qualquer uma das alas. Sempre foi forte no 1×1 com excelente capacidade de drible e na forma como explora a profundidade das defesas adversárias fazendo uso da sua velocidade e aceleração. Neste momento, nota-se uma evolução física que, não prejudicando a sua velocidade, tem permitido alicerçar as suas virtudes técnicas e tácticas.
Possante e com um bom pulmão, o médio francês está a fazer uma grande época. A curiosidade é que, tal como no caso de André Franco, também Rosier andava entre o onze e o banco na época passada e foi na subida ao principal escalão que pegou de estaca. O esquerdino é um dos "indiscutíveis" da equipa de Bruno Pinheiro, um médio capaz de jogar a "6" ou a interior, bom com bola e forte a defender. Tem passada larga, vence duelos individuais e equilibra a equipa. É referência para bolas longas, possui boa capacidade técnica, visão de jogo e define com qualidade. Tem também chegada a zonas de finalização e impacta nesse momento do jogo pelo bom jogo aéreo e remate espontâneo.
Redigido por Gonçalo Barbosa
• Treinador de Futebol - UEFA B
• Treinador de Técnica Individual
• Personal Trainer
• Comentador Desportivo
• Analista
• Scout / Observador
• Master Degree - High Performance Training
• Árbitro de Goalball
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