Nas últimas duas décadas, a atividade desportiva tem crescido tanto em número de praticantes como no que concerne aos níveis de exigência e intensidade impostos. Este crescimento tem sido acompanhado por um grande desenvolvimento científico dos parâmetros nucleares para o atleta, como a preparação física, nutrição e processo de treino, com vista à potenciação física e prevenção de lesões, nomeadamente as lesões do ligamento cruzado anterior particularmente comuns no futebol, basquetebol, voleibol e esqui.
Em alta competição, a cada minuto definem-se carreiras e as lesões do ligamento cruzado anterior, são frequentemente responsáveis pelo adiamento de uma oportunidade dourada de progredir ou até pelo abandono precoce da prática desportiva.
Breve fisiologia do ligamento e da lesão em si
Do ponto de vista biomecânico, o ligamento cruzado anterior impede a tíbia de deslizar para a frente do fémur e oferece estabilidade na rotação do joelho. É muito importante a nível sensorial pelo seu caracter propriocetivo (fonte de aferências sensoriais) que apresenta. Tal como mencionado previamente a sua lesão é comum, ocorrendo durante a prática desportiva, geralmente sem contacto direto com joelho, e associa-se frequentemente a lesões de outras estruturas (meniscos, ligamentos e cartilagem). O mecanismo de lesão nesta condição clínica divide-se em três possibilidades: movimento “ pivoting” , receção ao solo , contacto direto.
Na lesão do ligamento cruzado anterior, o doente habitualmente apresenta dor imediata após o traumatismo e refere sensação de estalido ou mesmo um som audível ao nível do joelho nesse mesmo instante. O inchaço secundário à acumulação de sangue na articulação (hemartrose) é observado algumas horas após o momento da lesão, agravando os sintomas dolorosos e a limitação da mobilidade.
Fases de reabilitação (breves notas importantes)
1º fase: Fase aguda e subaguda
Objetivos e procedimentos principais:
- Utilização de electroestimulação e “blood flow restriction” associada à contração muscular;
- Reverter a inibição muscular do quadricípite, decorrente da intervenção cirúrgica;
- Recuperar a extensão ativa do joelho (padrão de marcha anormal, inibição quadricipete, sobrecarga articular caso a mesma não seja atingida)
- Diminuição dos níveis de edema e dor pós cirurgia;
2º fase: Fase de reforço muscular e treino neuromuscular
Objetivos e procedimentos principais:
- Recuperar o equilíbrio unipodal (sobre a perna afetada), recuperar a força muscular do mesmo membro inferior e realizar um agachamento sem alterações significativas de alinhamento do membro;
- Diminuição do défice de rácio muscular entre músculos agonistas e antagonistas ao movimento (quadricipete/isquiotibiais)
- Introdução de exercícios como: squats, lunges , deadlifts, leg press, calf raises. Side bridge endurance. Balance exercises entre outros;
3º fase: Fase de corrida, potencia, agilidade e aterragem
Objetivos e procedimentos principais:
- Recuperar a totalidade ou maior parte de força muscular em relação ao membro não afetado;
- Completar um programa específico de agilidade e mudanças de direção com corrida de alta intensidade;
- Completar um progressão progressivo de saltos bilaterais e unilaterais com foco na receção e reação à queda no solo
- exercícios como : single hops , triple cross over hops, single press, mudanças de direcção uni e multi direcionais ;
4º fase: Return to play
Objetivos e procedimentos principais:
- Objetivo de promover ao atleta maior confiança e segurança no regresso ao treino integrado
- Transição de exercício focado num ambiente fechado e foco interno para um ambiente aberto (campo) focado na tarefa;
- Muita repetição e exercícios relacionados com bola, agilidade, velocidade, resistência;
- No fundo uma preparação final para aquilo que é o treino a competição.
Quando devo voltar a correr?
- Dor com score menor a 2 na escala visual analógica de dor;
- Flexão do joelho pelo menos 95% do lado não afetado;
- Extensão ativa do joelho total comparativamente ao lado não lesado;
- Ausência de edema no joelho;
- Força isométrica dos músculos hamstrings e quadricípite maior do que 70% do lado contralateral;
- Teste single hop maior do que 70% do lado contralateral;
- Agachamento unilateral ou step up sem aumento do valgo do joelho;
Quando posso voltar a jogar com a equipa/treino integrado sem condicionantes?
- Sem DOR ou edema após os exercícios realizados no ginásio e no campo;
- Força muscular do quadricípite maior do que 90% do lado contralateral;
- Força muscular isquiotibial maior do que 90% do lado contralateral;
- Défice no rácio quadricípite/isquiotibiais menor do que 10 %;
- Diferença no triplo salto unipodal menor do que 10% do lado contralateral;
- Diferença do salto vertical menor do que 10% do lado contralateral;
- Tolerãncia a todas as mudanças de direção com intensidade máxima e a sprints de intensidade máxima (mais do que 8m/s ou 25 km/h)
- Pontuação máxima na escala ACL-RSI que avaliação o estado psicológico e de confiança do atleta;
Conclusão - Notas muito importantes:
- Para cada mês que o retorno à atividade desportiva foi adiado até 9 meses após a reconstrução da LCA, a taxa de lesão no joelho foi reduzida em 51%.
-Nos primeiros 2 anos após a reconstrução da LCA, 30% das pessoas que voltaram aos desportos de elite profissional sofreram uma lesão em comparação com 8% dos que participaram de desportos de nível inferior.
-Mais força do quadricípite de forma simétrica em relação ao joelho contralateral antes do regresso à competição reduz significativamente a taxa de lesão do joelho.
- Implementação de um programa preventivo (poderá ser um tema abordar futuramente) é importantíssimo para o atleta;
Referencias Bibliográficas:
Buckthorpe et al. (2019) Optimising the Late-Stage Rehabilitation and Return-to-Sport Training and Testing Process After ACL Reconstruction. Sports Medicine.
Van Meclick et al.(2016) Evidence-based clinical practice update: practice guidelines for anterior cruciate ligament rehabilitation based on a systematic review and multidisciplinar consensus. Br J Sports Med.1506–1515
Rambaudetal. (2018) Criteria for return for running after anterior cruciate ligament reconstruction: a scoping review. Br J Sports Med. 1-9
Redigido por Rodrigo Gonçalves
Kommentare