O Estoril Praia sagra-se, esta terça-feira, bicampeão da Liga Revelação, algo que tem de ser referido com especial atenção. Os canarinhos garantiram, a duas jornadas do fim, o primeiro lugar e respetivo título, com 18 pontos conquistados em 24 possíveis, na fase de apuramento de campeão. Na primeira fase, os comandados de Vasco Botelho da Costa garantiram o passaporte para esta fase final ficando no segundo lugar, com 26 pontos, apenas atrás do SL Benfica, com menos três pontos - que, de resto, estão a sete pontos do campeão Estoril, na fase final, com dois jogos ainda por se realizarem.
Trata-se de um clube que, essencialmente, tem bem presente um projeto bastante bem estruturado e planeado. Um projeto de clube que não se restringe apenas ao plantel principal e ao que esse poderá fazer na Liga Bwin, mas que tem uma comunhão bastante positiva com os sub-23. Estes sub-23 que têm presente no seu plantel alguns jovens oriundos do escalão de Juniores, que aos poucos vão conquistando o seu espaço e tendo mais protagonismo - casos do guarda-redes Diogo Dias (18 anos); os defesas Tiago Parente (18 anos), Martim Filipe (17 anos), João Freitas (18 anos); o médio Gabriel Tavares (16 anos). Todos os jovens que atuam neste escalão têm porta aberta para a equipa principal, e isso, para o desenvolvimento de um atleta, é de extrema importância. Saber que têm possibilidades de ambicionar algo maior dentro do clube onde atuam, e que não têm, obrigatoriamente (como é caso em alguns clubes), de ir à procura de outro contexto para mostrarem toda a sua qualidade e potencial.
Se Bruno Pinheiro, eventualmente, sair no final da temporada, vejo também portas abertas para o treinador Vasco Botelho da Costa, e a respetiva equipa técnica, serem promovidos à equipa principal. O trabalho de Vasco Botelho da Costa não pode ser menosprezado, sendo que, no final da presente temporada, irá fazer dois anos e meio desde que o treinador assumiu a equipa, depois da promoção à equipa principal de Pedro Duarte na época 2019/20- daí também acreditar na promoção do atual técnico dos sub-23, tendo em conta essa boa ligação existente entre os dois escalões. O treinador de 33 anos teve passagens pelo Dramático de Cascais- onde treinou desde o futebol de 7 até aos Juniores-, Juvenis e Juniores do Estoril Praia- de onde foi promovido para a equipa de sub-23. Desde que assumiu a equipa, até ao momento, o Estoril Praia conquistou três títulos- entre eles dois troféus da Liga Revelação e um troféu da Taça Revelação-, para além de, a sua equipa ser marcada por um DNA de futebol positivo e associativo.
Esta equipa procura ter um futebol apoiado, com uma saída curta desde trás - através do seu guarda-redes e centrais -, chegando ao último terço do terreno com calma, frieza, e, acima de tudo, qualidade no processo, dando aos atletas protagonismo. Parte de um sistema de 1x4x2x3x1, no entanto esta estrutura desdobra-se ao longo do jogo, apresentando muitas nuances. Na primeira fase de construção, procura criar superioridade numérica através da presença do seu guarda-redes, abrindo o DCD no lado direito, e o LE no lado esquerdo, estando um pouco mais adiantados (atrás da primeira linha de pressão adversária) o DCE e um dos pivôs, fazendo com que o LD se projete no terreno, e dando a largura no lado esquerdo o MOE. O outro pivô (recebe algumas vezes descaído no lado esquerdo, outras está mais perto do PL), o MO (entre a linha média e defensiva adversária, baixando algumas vezes para receber a bola) e o MOD (muitas vezes perto do PL) movimentam-se para receber a bola dentro do bloco adversário, ou mesmo para abrir espaços para a bola entrar em outros jogadores. Quando a bola entra no bloco, a equipa procura acelerar o jogo, com passes de rotura na linha defensiva adversária, ou até mesmo virando o flanco do jogo. Se a equipa não consegue ligar dentro do bloco adversário, procura o PL Gilson Benchimol Tavares - um dos jogadores em destaque desta equipa.
Igualmente na temporada passada, a equipa comandada por Vasco Botelho da Costa realizou uma época notável, onde conquistou os dois troféus possíveis (Liga e Taça Revelação). Muitos jogadores dessa equipa tiveram oportunidade de pisar em outros palcos, tanto na equipa principal - Chiquinho, Bernardo Vital, Volnei Feltes, Gilson Benchimol - como também em outros contextos- Gustavo Klismahn no Alverca (Liga 3), Lucho Vega no Alcorcón (Segunda Liga Espanhola), Vasco Oliveira no Farense (Liga Portugal 2 Sabseg), Elias Achouri no Trofense (Liga Portugal 2 Sabseg), Sandro Cabral no Cova da Piedade (Liga 3), Nuno Macedo no Penafiel (Liga Portugal 2 Sabseg). O caso mais flagrante foi mesmo o de Chiquinho, que esta temporada se destacou pelo plantel principal na Liga Bwin, sendo depois vendido para o Wolverhampton por uma verba a rondar os cinco milhões de euros. Como já teve oportunidade de referir, inúmeras vezes, o treinador Vasco Botelho da Costa, o objetivo desta equipa de sub-23 é potenciar os jovens jogadores da melhor forma possível, tendo em vista, no futuro, darem uma boa resposta a um contexto competitivo de elevada dificuldade.
Destaques individuais
João (Jota) Oliveira (19 anos)
Um guarda-redes muito seguro a jogar com os pés, dando múltiplas soluções à equipa para conseguir sair a jogar desde trás com qualidade, criando superioridade numérica na zona mais recuada do terreno- a prova que, atualmente, é cada vez mais importante um guarda-redes ter um bom jogo de pés. Para além disso, o jovem guarda-redes possuiu um bom posicionamento entre os postes, que lhe permite, em algumas situações, ser decisivo e segurar alguns resultados e exibições menos conseguidas da equipa. Um ponto onde acredito que pode melhorar é o timing de saída a cruzamentos, onde apresenta ainda algumas debilidades.
Volnei Feltes (21 anos)
O defesa central chegou ao Estoril Praia proveniente do Internacional de Porto Alegre, na época transata. O central destaca-se pela sua capacidade no jogo aéreo, não só na vertente ofensiva - onde já leva quatro golos apontados - mas também na vertente defensiva, onde consegue ganhar muitas bolas aos seus adversários através do seu poderio no jogo aéreo e físico. Apresenta também bons comportamentos na linha defensiva e timings de desarme, tal como (apesar não ser um dos seus pontos mais fortes) uma boa qualidade de passe- que tem vindo a melhorar substancialmente através da ideia de jogo de Vasco Botelho da Costa, que promove um jogo associativo, onde os centrais têm um papel preponderante na primeira fase de construção da equipa, tendo eles, muitas vezes, de encontrar soluções para a bola entrar dentro do bloco, e consequentemente queimar linhas. Um central que já está claramente num nível que lhe permite atuar em outros palcos - esta época já participou em dois jogos pela equipa principal.
Afonso Valente (20 anos)
Afonso Valente, como se costuma dizer, joga de “cadeirinha” no meio-campo dos canarinhos, e este é um dos casos em que não entendemos como ainda não deu “o salto” para a equipa principal. Um médio com uma classe sublime, que atua em duplo pivô no meio-campo. Uma qualidade de passe e visão de jogo extraordinária, capaz de sair facilmente de pressão, além de, conseguir encontrar espaços que só os melhores conseguem encontrar. Nos últimos tempos, tem vindo a ter uma evolução bastante positiva no que toca ao momento da reação à perda de bola e índices de agressividade sem bola, em transição defensiva. Um jogador de outro patamar, que tem condições para atuar em outros palcos brevemente.
Duarte Carvalho (19 anos)
Mais um médio no plantel do Estoril com uma classe soberba, que mais cedo ou mais tarde estará noutros contextos. Duarte Carvalho chegou ao Estoril Praia, em janeiro, proveniente do Sporting, depois de ter atuado, ao serviço dos leões, nos sub-23 e na equipa B, e é um dos grandes percalços da estrutura leonina nos últimos anos - ter deixado sair um jogador com esta tremenda qualidade. A sua grande qualidade técnica, de passe e tomada de decisão acima da média, fazem dele as suas principais características, tendo um papel de maior “liberdade” neste modelo de jogo de Vasco Botelho da Costa, comparativamente ao que tinha nos sub-23 e na equipa B do Sporting. É um jogador crucial para a equipa conseguir chegar ao último terço com maior qualidade e fluidez no seu jogo, trazendo muita impressibilidade aos adversários.
Serginho (21 anos)
O médio criativo alia a sua qualidade técnica invejável, à sua tomada de decisão bastante assertiva em muitos momentos. É um médio mais propício a jogar perto do último terço do terreno, também pela sua capacidade de finalização. Nos últimos jogos, com a presença de Duarte Carvalho na sua posição, o seu nome tem passado para segundo plano nas opções de Vasco Botelho da Costa para o 11, e esta é de facto uma boa dor de cabeça para o treinador canarinho, ter de escolher para a mesma posição um de dois jogadores com enormíssima qualidade - apesar de Serginho também poder atuar mais descaído para o lado direito.
Gilson Benchimol Tavares (20 anos)
O avançado, não há relativamente muito tempo (na época 2019/20), atuava nos Juniores do Damaiense, e revelou, a uma entrevista ao Canal 11, que quase desistiu do futebol para ir trabalhar. Mais tarde (mais especificamente na época 2020/21) chegou aos sub-23 do Estoril Praia, onde começou a ter um grande destaque, tendo nessa época apontado 7 golos em 27 jogos. Esta época, já leva 9 golos apontados em 15 jogos, um registo bastante positivo.
O jovem de 20 anos destaca-se, sobretudo, pela sua aptidão física e capacidade de segurar bolas, abrindo espaços para os colegas aproveitarem. Para além disso, possui ainda uma boa velocidade e ataque à profundidade - apesar de o timing de ataque à profundidade por vezes não ser o melhor, caindo algumas vezes em posição de fora de jogo, e sendo este um aspeto que deve melhorar. Tem uma finalização apurada, que lhe permite ser decisivo em muitos jogos.
Um Projeto com "P" grande!
Acima de tudo o que sejam estas conquistas, está um projeto. O projeto do Estoril não é de hoje, e através da sua estrutura tem feito um trabalho assinalável, sendo um dos clubes mais bem estruturados a nível nacional - apesar dos poucos recursos que possui. Serve de exemplo para os clubes ditos mais “pequenos”, que não é necessário ter uma grande capacidade financeira para fazer as coisas “bem feitas”, e aproximar-se do sucesso por essa via.
Há uma pessoa que tem um papel claro e fundamental no que é a condução deste projeto - Pedro Alves. Atua como diretor desportivo no papel, mas na prática possui inúmeros papeis dentro da estrutura do Estoril Praia.
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